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sábado, 19 de outubro de 2013

Virando Seu Mundo de Cabeça Para Baixo


Cordiais saudações aos amigos e amigas que me concedem a honra de vossa presença.
Estou aqui mais uma vez para colocar um pouco mais sobre esse universo, esse mundo absolutamente peculiar, tão diferente de tudo, que é o mundo dos tripulantes de navios de cruzeiro.
Polêmicas e dificuldades a parte, a gente segue em frente, afinal este é o movimento natural de todos aqueles que querem evoluir, que querem melhorar, que querem vencer de alguma forma na vida.
Uma pessoa (que eu saiba não é tripulante) compartilhou esta gif  no Google+, já faz um tempinho e infelizmente não lembro seu nome para lhe dar os devidos créditos, lembro apenas que foi uma menina. De qualquer modo, achei muito show de bola, perfeita para fazer um post sobre aquele turbilhão de sentimentos que aflora nos primeiros dias do primeiro contrato daquele marinheiro de primeira viagem, de certo modo, ainda bem ingênuo, inocente. Cheio de expectativas, tomado das melhores intenções e com a certeza de que está vivendo um grande momento em sua vida.
A fora um ou outro caso (afinal ninguém é igual ninguém), parece-me que esta é a maneira como aqueles que passam por este tipo de situação pela primeira vez a encaram. E é exatamente neste sentido que a gif que ilustra este texto tem tudo a ver com o tema. As primeiras horas a bordo, os primeiros dias, enfim os primeiros momentos serão mesmo marcantes pelo resto da vida, seja para o bem, seja para o mal, daqueles que experimentarem esta experiência. A visão do navio impressiona em sua primeira aparição. Gigantesco, monumental, imponente. Como se achar, uma vez lá dentro? Como encontrar a sua cabine, o seu local de trabalho e todos as outras localidades que você precisa acessar, sempre com urgência (é tudo sempre tão urgente a bordo)? Será que meu inglês será suficiente para que eu me faça entender? Será que eu entenderei tudo aquilo que me será dito? E se isso não acontecer? Será que isso? Será que aquilo? Mas se...
É a coisa pega fogo já na largada mesmo. E nunca se esqueça que há fatores agravantes ao aspecto psicológico e também ao físico. Caso você saia do Brasil para embarcar na Europa (fato bem comum), terá que encarar uma viagem de pelo menos umas 12 horas (um pouco mais, talvez um pouco menos). Terá a questão do fuso horário (médicos afirmam que mais de 4 horas de fuso pode confundir o sistema biológico do corpo). O cansaço da viagem, a excitação e a adrenalina provocada por toda a tensão natural de uma situação cheia de mistérios e que por mais informações prévias que você tenha se manterá em grande parte envolta em uma nuvem de suspense e apreensão. E o mais importante (sempre na minha humilde opinião, nunca vou deixar de lembrar), você estará a milhas e milhas distante de casa. Distante daqueles que ama, distante daquela vida segura e cotidiana que você tinha até algumas horas atrás e que te entediava, mas agora, pode acreditar, seu mundo virou de cabeça para baixo. Como se não bastasse tudo isso, também não esqueça, o seu contrato está apenas começando.
Não, definitivamente não é nada fácil estes primeiros momentos a bordo para aqueles que estiverem em seu primeiro contrato. Obviamente alguns terão a sorte de conseguir amenizar a situação tendo algum amigo a bordo com quem consiga fazer contato logo de inicio ou que seja muito despojado de sua família e não sinta tanto a falta, nem dela, nem de seus amigos deixados para trás. Ainda assim, é certo que terá um período de adaptação até que consiga começar a colocar as coisas em ordem em sua vida novamente e deixar seu mundo de novo "virado para cima". Mas aí, como esta gif espetacularmente tem a ver com este mundo de tripulantes e suas atribulações, vem aquela máxima que a bordo te pega em cheio no momento mais injusto - "Quando você acha que tem todas as respostas, vem a vida e muda todas as perguntas". 
Em síntese a coisa só vai mesmo entrar ou melhor querer começar a entrar nos eixos lá pelo sexto, talvez quinto ou sétimo mês de contrato, dependerá muito do ritmo de cada um. Ou seja, de qualquer forma, você estará mais adaptado e conseguirá tirar melhor proveito da experiência quando já estiver passando ou chegando na metade do seu contrato (isso se ele for mais longo, tipo o de nove meses como foi o meu primeiro contrato quando fiquei dez meses e uma semana a bordo). Porém, um número considerável de tripulantes (brasileiros, não vi isto acontecendo com outras nacionalidades, mas veja bem, não estou dizendo que não aconteça com outras nacionalidades também, estou apenas dizendo que não notei isto no tempo em que estava a bordo), salta da barca bem antes. Muitos chegam mesmo a pedir sign off ainda no primeiro dia, não querem esperar se quer o próximo porto. Algumas vezes eu achava engraçado aquele ar desesperado deles, parecendo mesmo que se duvidassem se jogariam ao mar e voltariam a nado para casa. Felizmente isto nunca chegou a acontecer. Observei ainda que estes eram brasileiros que tinham uma vida muito boa e confortável em suas casas, aqui no Brasil. Gozavam de uma boa estrutura familiar, tinham tudo do bom e do melhor, o que é muito legal. Bom seria se todos neste país pudessem usufruir da mesma situação, mas infelizmente sabemos não é bem assim. Também preciso fazer justiça com vários tripulantes brasileiros que conheci a bordo e que não teriam, ao menos no aspecto financeiro, nem um motivo para estar passando por todas as adversidades e dificuldades que a vida de tripulante impõe, mas que no entanto, estavam lá firmes e fortes enfrentando muito bem a situação e a tirando de letra. No meu caso em particular, eu tive certeza que tinha conseguido a vaga quando na entrevista, ainda em Porto Alegre-RS, eu disse que trabalhava em dois empregos numa média de 16 horas por dia aproximadamente e que já vinha neste ritmo por mais de um ano.
Há enormes diferenças entre as classes sociais no mundo todo. Um verdadeiro abismo. As condições são mesmo bem ruins e precárias na maior parte dos países pobres e em alguns ditos em desenvolvimento, como é o nosso caso aqui no Brasil, mas aí eu já estou fugindo do tema proposto no post de hoje, porém, por outro lado, é verdade que uma análise mais equilibrada requer que consideramos estes pontos.
De qualquer forma, em resumo é isso. Se você estiver na condição de tornar-se tripulante de navios de cruzeiro, meu conselho, prepare-se para virar seu mundo de cabeça para baixo, mas, de forma alguma desanime ou ache que por causa disso terá que descer logo ali na primeira parada. Que nada, aposto que você é muito mais forte do que você mesmo acreditava ser e lembre-se, ainda que muitos tenham desistido outros tantos persistiram e passaram por todo o contrato. Chegaram ao final e puderam avaliar melhor tudo o que passaram ao olhar para trás. Alguns odiaram, é verdade e além de nunca mais voltar, dedicaram uma parte de suas vidas a propagar a sua opinião de que está é uma grande bola fora, o maior erro que alguém pode cometer na sua vida. Outros, por outro lado, saem desta concluindo exatamente o oposto, retornam uma, duas, três vezes ou mais e estes também dedicam boa parte de suas vidas a incentivar aqueles que desejem ter a mesma vida. Há muitos blogs e imensa discussão acalorada dos dois lados em grupos no facebook, não cabe a mim te dizer qual dos lados seguir. Eu diria, ainda que possa soar batido e surrado ou mesmo fora de moda, meio demodê, "siga seu coração". Acredito que cada um deva fazer seu próprio caminho, escrever sua própria história e ao final de tudo é a cada um que cabe a decisão final sobre a sua vida e os rumos que ela deve tomar. A minha experiência foi sofrida, dura, cheias de altos e baixos, mas foi válida e não me arrependo. 
Um ótimo findi pra todos, fiquem com Deus e até a próxima! 

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